Um nhoque para lembrar meu avô

Sempre gostei muito do meu avô materno. Acho que ele foi um cara legal, engraçado, inteligente, inquieto  e doce. Eu nunca cheguei a conhecê-lo, mas isso não parece fazer diferença. Tenho uma espécie de saudade dele, como se tivéssemos convivido em algum período da vida.

Claro que o que eu tenho, na verdade, é só uma ideia, uma imagem construída com vários pedacinhos, desde as histórias que minha mãe conta até as fotos antigas. Mas isso para mim não explica tudo. Também ouvi casos e vi fotografias de outros familiares que não conheci. Com esse avô é diferente.

Antes eu achava que era porque ele gostava muito de escrever e conversar com as pessoas, duas coisas com as quais me identificava. Depois pensei que poderia ser uma admiração do seu jeito “faz tudo”, já que ele nunca teve profissão formal e mudou de negócio várias vezes. Hoje sei que é tudo isso, mas recentemente descobri o mais importante: meu avô era dramático. Muito dramático.

Consigo enxergar várias coisas da minha personalidade que herdei do meu pai e da minha mãe. O drama, não. E esse sempre foi o maior dos mistérios para mim. Nunca entendi de onde vem esse exagero meu na hora de ver e sentir as coisas. Um dia lendo as cartas que o vovô escrevia para a minha avó, entendi. Veio dele.

Nas correspondências, ele parece sempre viver o auge do romantismo, achando que qualquer desgosto é o fim do mundo e qualquer alegria é felicidade permanente. A minha carta favorita é uma em que ele ainda namorava minha avó e se defende de um boato que inventaram sobre ele. Não vou reproduzir a carta toda aqui para não ferir a intimidade dessa história que, acredito, nem eu deveria ter ficado sabendo. É difícil escolher o melhor trecho, mas acho que é esse:

“A mentira inocente, ameniza a vida; mas a mentira que afeta a honra ou a dignidade de quem quer que seja, é um ato torpe, vil baixo, desprezível, proprio de gente bronca e sáfara. Se eu conseguir descobrir o autor (ou autora) de tão infame ignominia, far-lhe-ei um protesto condigno.”

Morro de rir lendo essa carta. Parece que me vejo numa versão do século passado. Sinto ainda mais como se eu o conhecesse. Além de me identificar, fico aliviada. Desde que li seus textos, tenho um jeito de explicar porque sou tão dramática desde pequena: é coisa do sangue. Coisa do vô Joaquim.

***
Nhoque de batatas – um passo a passo
Minha mãe sempre fala com alegria do nhoque que ela comia em casa na infância. De como era uma comida que envolvia a família toda e demorava um bom tempo para ficar pronta. Quando penso nos meus avós maternos, penso em nhoque. Imagino meu avô ajudando a fazer os rolinhos e minha avó na beira do fogão cozinhando.

Antes de tentar fazer em casa, li bastante sobre o assunto e realmente o segredo está nas batatas, que precisam estar com o mínimo de água. Como é difícil saber se a batata está boa para nhoque ou não, preferi garantir usando o tipo Asterix, que é mais seca, e assá-las em vez de cozinhar na água. Depois é só usar o mínimo de farinha possível. Isso vai garantir um nhoque leve e de ótima textura.

Rendimento: seis porções

Ingredientes

- 600 gramas de batata de casca roxa, tipo Asterix (de 4 a 6 batatas, dependendo do tamanho)
- sal grosso (2 colheres de sopa para cada batata)
- 2 gemas
- 80 gramas de parmesão ralado (3/4 de xícara)
- 120 gramas de farinha (1 xícara)
- 1 colher de chá de sal
- noz moscada à gosto

Como fazer

1. Pré-aqueça o forno a 200 graus. Corte quadrados de papel alumínio de tamanho suficiente para enrolar as batatas. Coloque duas colheres de sopa de sal grosso no papel, formando uma “caminha” para as batatas. O sal grosso ajuda a absorver a umidade. Embrulhe-as e leve ao fogo por cerca de 40 minutos, até que esteja bem macias.

2. Passe as batatas pelos espremedor ou descasque e amasse com um garfo. É importante trabalhar com elas ainda quentes. Misture o queijo,as gemas, o sal e a noz moscada. Adicione a farinha aos poucos, pois o melhor nhoque é aquele que tem a menor quantidade de farinha possível. Dependendo da batata, pode ser que você não precise use toda a farinha – eu, por exemplo, usei só metade da xícara. Vá colocando farinha e misturando apenas até que vire uma massa coesa e seja possível moldar rolinhos sem grudar nas mãos. A massa deve, no entanto, permanecer macia  e úmida.


3. Numa superfície levemente enfarinhada, faça rolinhos com porções da massa e corte em pedaços de mais ou menos dois dedos. Você pode cozinhá-los nesse formato ou então fazer do jeito tradicional, como minha avó fazia, passando-os pelo garfo. Dessa forma o nhoque cozinha mais uniformemente e absorve mais molho. Você vai enfarinhar levemente um garfo e segurá-lo com uma mão. Com o dedo indicador ou o dedão da outra, pressione levemente um dos pedaços contra a parte curva do garfo e ao mesmo tempo deslize (e não arraste) ele em direção às pontas do garfo. Deixe-os cair na superfície de trabalho.


4. Antes de cozinhar o nhoque, separe uma bacia com água e gelo e uma travessa com pedacinhos de manteiga no fundo. Coloque uma panela grande com água no fogo. Quando ferver, jogue metade dos nhoques. Assim que eles subirem à superfície, retire com uma escumadeira e dê um choque térmico jogando-os na bacia com gelo, e logo depois na travessa. Cozinhe a outra metade dos nhoques da mesma forma.


5. Distribua o molho de sua preferência bem quente por cima dos nhoques na assadeira e  misture. Eu finalizei com parmesão e manjericão.

1 Comentário

Arquivado em Massas, Prato único

Uma resposta para Um nhoque para lembrar meu avô

  1. Tatá

    Nina, minha mãe quer que você faça porçõezinhas de nhoque pra vender (pré pronto). Ah, e porçõezinhas de molho vermelho. Ela vai virar freguesa! Ela ficou com água na boca ao ver a foto!!!

Palpite!

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